Se você esteve de olho nos canais de comunicação das últimas semanas, com certeza se deparou com o nome Lojas Americanas. A notícia sobre a enorme dívida esteve presente em quase todas as mídias.
E para te ajudar a entender melhor sobre o que aconteceu com a empresa, o GVAngels chamou o Ivan Cordeiro, CFO da Caveo e professor universitário na disciplina de Auditoria.
Segue análise realizada por Ivan:
A questão financeira da Lojas Americanas
A Lojas Americanas (AMER) entrou em uma amarga lista de escândalos financeiros mundiais ao apresentar na última semana, por meio de uma declaração do recém-empossado CEO da Companhia Sérgio Rial, problemas contábeis na apresentação dos resultados que foram estimados inicialmente em R$ 20 bilhões.
Este tema acabou resultando na saída do próprio executivo assim como também do CFO da empresa, André Covre. Ambos haviam assumido um mandato recente para conduzir os negócios da empresa a partir do ano de 2023.
Porém, poucos dias após o início de suas novas posições, os executivos destacaram que a companhia apresentava `distorções importantes` no balanço patrimonial dos últimos anos, com efeitos relevantes nos resultados de suas operações.
Um dos principais motivos que levou às diferenças bilionárias foram as contratações de operações de crédito junto aos bancos, feitas para realizar o pagamento de fornecedores. Isso porque os valores destas transações financeiras não eram devidamente inseridos no resultado da empresa, mas sim em uma conta que permanecia vinculada junto aos fornecedores.
Ao fazer isso, a empresa elevou seus resultados anuais, criando uma série de desdobramentos negativos junto aos stakeholders, além da própria crise de identidade criada no mercado financeiro – Rial destacou que esta operação ocorria há bastante tempo e não são “somente 2 ou 3 anos”, mas algo em torno de 5 a 10 anos.
Repercussão negativa
Isso acabou repercutindo mais gravemente na última sexta-feira (13/01/2023).
Inicialmente, os 20 bilhões de reais destacados não tinham uma exigência de desembolso – conhecido “efeito-caixa”-, mas a gravidade do tema preocupou justamente os principais envolvidos nesta operação: os bancos.
As instituições bancárias passaram a avaliar a execução de cláusulas contratuais das operações de crédito, também conhecidas como `covenants financeiros`. Estas cláusulas poderiam exigir o cumprimento imediato das obrigações por parte das Lojas Americanas, aumentando a pressão sobre o caixa da Companhia e elevando o impacto do problema.
Uma estimativa de mercado destaca que esta nova situação poderia atingir um patamar ainda mais elevado em relação ao tamanho original do problema, para algo em torno de 40 bilhões de reais, o que provavelmente exigiria um aporte robusto de capital por parte dos sócios para manter a operação ativa.
Lojas Americanas entram com pedido de recuperação judicial
Como forma de defesa, a Lojas Americanas entrou, na quinta-feira (19/01/23), com um pedido de recuperação judicial para evitar cobranças desta natureza e, assim, ganhar tempo para dimensionar toda a situação.
A dívida declarada pela empresa foi no valor total de R$ 43 bi. Porém, conforme declarado em uma nota, a organização continuará com suas operações funcionando de acordo com as regras impostas pela recuperação fiscal.
A varejista solicitou um prazo de 48 horas para apresentar a lista completa dos credores. Além disso, pediu também um prazo de sessenta dias para que um plano de recuperação seja apresentado.
Os próximos passos
Após a abertura do pedido de recuperação judicial, a Lojas Americanas aguarda a resposta referente ao pedido. Caso a recuperação judicial seja negada, é possível que a empresa precise decretar falência. Porém, caso aceito, a organização terá 180 dias de suspensão das cobranças.
Por fim, outro alerta grave ecoou no tocante ao papel dos auditores. Por se tratar de algo que ocorria há bastante tempo, além da magnitude do próprio evento em si, há um questionamento sobre a ausência de qualquer menção por parte da PWC (Price Waterhouse Coopers), atual auditor da Companhia.
Existe ainda a possibilidade de uma outra empresa de auditoria estar envolvida no caso, pois o tempo máximo de relacionamento com uma companhia listada em bolsa é de 5 anos – existe uma regra de rodízio dos auditores para evitar vícios no processo de revisão).
Os auditores já sinalizaram que estão revisando todos os seus processos e papéis de trabalho em conjunto com a administração da Lojas Americanas. Dessa forma, novos fatos virão à tona nas próximas semanas.